CHINA TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS

China reduz retirada arbitrária de órgãos de condenados

Manifestantes em protesto pelo fim do transplante forçado na China (Foto: Twitter)

O sistema de transplante de órgãos da China já foi alvo de repúdio internacional por vender órgãos retirados de prisioneiros condenados à morte para pacientes dispostos a pagar vastas quantias de dinheiro por eles.

Hoje, o país finalmente caminha na direção contrária, graças ao empenho e perseverança do ex-vice-ministro da Saúde chinês, Huang Jiefu, e do cirurgião americano especializado em transplante de órgãos Michael Millis.

O uso de órgãos de prisioneiros sempre fez da China pária mundial no campo de transplantes. Recorrendo a órgãos de pessoas condenadas em um corrupto e desumano sistema judiciário, a China criou a segunda maior indústria global de transplantes, atrás apenas dos Estados Unidos.

Tratava-se de uma prática sistematicamente não regulamentada, na qual os órgãos eram entregues não aos pacientes que mais necessitavam, mas sim aqueles com as ofertas mais altas. Vastos lucros eram gerados, ao passo que a ética médica era deixada de lado. “Interesses financeiros guiavam a negligência profissional. O transplante de órgãos se tornou um jogo de riqueza e poder, sem qualquer justiça social”, disse Huang Jiefu, em entrevista ao Washington Post.

Também em entrevista ao Post, o advogado Yu Wensheng deu um vislumbre de como funciona a prática, com base em relatos de um de seus clientes que em novembro do ano passado dividiu cela com um condenado à morte. Segundo Wensheng, o prisioneiro condenado recebeu um formulário para assinar que indicava que ele “voluntariamente” aceitava doar seus órgãos.

“Os condenados tinham a opção de não assinar o formulário, mas ficariam altamente sujeitos a maus-tratos e sofrimento se optassem por não assinar. Caso assinassem, seus últimos dias seriam mais tranquilos”, disse Wensheng.

A mudança em relação à prática começou a acontecer em 2006, quando Jiefu se tornou o primeiro a assumir publicamente um segredo guardado pela classe médica chinesa: que os órgãos de condenados eram a base da crescente indústria de transplantes do país.

Na mesma época ele conheceu Millis. Ambos eram funcionários de centros ligados à Fundação Rockefeller e sua ramificação na China, a China Medical Board (CMB), e ao se conhecerem descobriram ter em comum o receio em relação à indústria de transplantes chinesa.

A dupla concordou em trabalhar junta para eliminar os transplantes irregulares feitos com órgãos de prisioneiros. Após chegarem à conclusão de que um fim abrupto à prática não era viável, pois iria gerar um mercado negro de órgãos, eles decidiram que a eliminação gradual era a melhor opção e começaram a pesquisar abordagens alternativas.

Jiefu elaborou um registro de doadores voluntários destinado a superar os interesses incrustados na velha prática e a tradicional aversão dos chineses em ter o corpo desmembrado após a morte. Assim entrou em voga no país um sistema no qual doadores se cadastram através da internet ou de um aplicativo, criando uma base de dados para encontrar receptores compatíveis. Assim que um órgão disponível é encontrado pelo sistema, médicos de pacientes que aguardam são avisados por mensagem de texto. O pagamento pelo órgão pode ser feito pelo Alipay, um sistema online de pagamento amplamente difundido. O cadastro já conta com mais de 230 mil pessoas.

“Nosso sistema é transparente e rastreável. Sabemos de onde cada órgão vem e para onde cada órgão vai”, diz Jiefu. O sucesso do sistema se refletiu na queda no número de centros de transplantes na China de mais de 600 centros sem regulamentação para 160 aprovados e registrados oficialmente.

O método ainda é alvo de ceticismo e muitos acreditam que a prática arbitrária persiste. No ano passado, por exemplo, a câmara dos deputados americana aprovou uma resolução condenando a captação forçada de órgãos na China apoiada pelo Estado, e acusando o Partido Comunista de matar presos políticos, mantidos encarcerados em segredo longe das penitenciárias comuns, para alimentar a indústria de transplante no país.

“Não podemos permitir que esses crimes prossigam”, disse a deputada republicana Ileana Ros-Lehtinen, ao apresentar a resolução. A deputada também acusou a China de promover uma ditadura cruel ao perseguir praticantes pacíficos de Falun Gong, movimento espiritual que ganhou força nos anos 1990 na mesma proporção que despertou desconfiança no governo chinês, sendo proibido em 1999 sob a pena de prisão. Lehtinen também chamou atenção para a “doentia e antiética prática” de retirar órgãos sem consentimento.

Porém, algumas pessoas estão otimistas e acreditam que a tendência está mudando. Um deles é o australiano Jeremy Chapman, ex-presidente da Sociedade Internacional de Transplantes, que no passado criticou duramente as práticas de transplante chinesas. “Tem ocorrido uma mudança substancial na China que caminha para a direção certa”, disse Chapman, em entrevista ao Post.

Jiefu está otimista, mas reconhece que ainda há muito a ser feito, especialmente para combater a clandestinidade. Ele prega tolerância zero em relação ao uso de órgãos de condenados, mas reconhece que isso é um desafio. “Em um país de 1,3 bilhão de pessoas, estou definitivamente certo de que há alguma violação à lei”, disse Jiefu, em uma conferência dada em fevereiro deste ano no Vaticano.The Washington Post

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