LIVROS HOLOCAUSTO

‘É Isto um Homem?’, um relato pessoal dos horrores de Auschwitz

Livro retrata os horrores pessoais do Holocausto (Foto: Auschwitz Memorial and Museum/Wikimedia)

Em Auschwitz, o exausto e faminto Primo Levi não recebia sequer o alívio de uma noite de sono. As horas de escuridão eram, ele escreve em seu livro “É Isto um Homem?”, lançado no Brasil pela editora Rocco, por muito tempo, passadas deitado em seu estreito beliche de madeira com o nariz pressionado contra os pés de um homem cujo rosto ele nunca tinha visto, “forçado a trocar suores, cheiros e calor… sob o mesmo cobertor”.

Muitas outras dores aparecem nesse capítulo sobre “nossas noites”: os gemidos, os roncos, os gritos gerados por pesadelos aterradores. Termina de manhã. Lá vem a ordem para se levantar, um “furacão” de gritos e golpes sobre os prisioneiros, e uma corrida frenética para fazer as camas e se vestir sem perder de vista os objetos (como colheres rudimentares e fios de reposição para costura) que os prisioneiros precisam para sobreviver. Finalmente, Levi nos diz, ele desce ao chão, coloca seus sapatos, “as feridas nos pés reabrem, e um novo dia começa”.

Aqueles dias foram ainda piores que as noites. Levi cataloga mais horrores, humilhações, agonias físicas e morais do que somos capazes de compreender. Graças à escrita precisa e vívida de Levi, podemos ter uma ideia do que significa ser privado de uma noite de sono “segura em uma casa quente”, como diz o poema no prefácio do livro. Levi mostra como é viver em constante medo pela vida e o que significa ser exposto, nu, ao frio cortante do inverno polonês e ao “vento forte dos Cárpatos” – uma cadeia de montanhas que vai da Europa Central ao Leste Europeu.

Ele pode abordar os leitores como pessoas retiradas de sua experiência no início do livro, mas ele também nos traz o dom da empatia. Ele faz um trabalho notável em nos ajudar a ver o que ele passou, enquanto nos pede para considerarmos se poderíamos ter resistido contra as probabilidades.

Seria muito provável tornar-se um dos vencidos, escolhido “para a chaminé” por um kapo – prisioneiro do campo de concentração responsável por vigiar outros prisioneiros -, ou sucumbir à fome, doença, excesso de trabalho, ao desespero.

Teria sido mais fácil se tornar um kapo, colaborar com os nazistas e trair seus companheiros de prisão porque oferecia uma maneira de sobreviver? Talvez, se tivéssemos o tipo de boa sorte que o autor ironicamente atribui a si mesmo na primeira frase de seu prefácio, poderíamos estar em posição semelhante ao próprio Levi.

Mas esse senso de afinidade só pode ir tão longe porque o autor nos dá um poderoso senso da universalidade do sofrimento, mas sempre nos lembra da estranha particularidade de sua situação. A história de “É Isto um Homem?” é uma longa cadeia de coincidências e eventos estranhos que selaram seu destino. Além disso, muitos momentos quase aleatórios de, por falta de uma expressão melhor, boa sorte.

Pouco precisa ser dito sobre a monstruosa estupidez da ideia de que uma morte é uma tragédia e um milhão é uma estatística, como acreditava Adolf Eichmann, um dos principais líderes do Holocausto, mas serve como uma indicação da importância desse livro. Levi faz com que cada um desses 6 milhões de assassinatos seja uma tragédia individual, e nos ajuda a entender o que cada um deve ter significado em termos de sofrimento humano.The Guardian

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