INTERNACIONAL NÍCARÁGUA

A cruel repressão da Nicarágua à greve de fome

Treze ativistas foram detidos ao tentar entregar água para mães que faziam greve de fome (Foto: @ArticulacionNic/Twitter)

A repressão do governo da Nicarágua a críticos e ativistas, elevada há 18 meses – quando eclodiu uma onda de protestos contra o regime autocrático de Daniel Ortega – não ocupa mais o mesmo espaço que ocupava nos noticiários.

Porém, isso não significa que ela cessou ou diminuiu. Ao contrario: segue a pleno vapor, ofuscada por uma série de outras crises que afetam países do continente americano.

O alerta foi feito por entidades especializadas em direitos humanos, como a Human Rights Watch (HRW) e o Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR).

Se por um lado jornalistas proeminentes começaram a retornar à Nicarágua após meses exilados, como Carlos Fernando Chamorro e Jenny Ortiz, por outro a repressão do governo a críticos, inclusive à Igreja Católica, segue em vigor – a Catedral de Manágua chegou a ser invadida por grupos violentos alinhados ao governo, que causaram destruição.

Grupos de mães e familiares de pessoas detidas pelo governo de Daniel Ortega já tentaram, em diferentes oportunidades, fazer greves de fome para chamar a atenção do governo e pedir a libertação dos detidos nas manifestações. Uma das últimas tentativas ocorreu na Igreja San Miguel Arcángel em Masaya, Nicarágua. No entanto, a iniciativa enfrenta repressão do governo.

No mesmo dia que a greve de fome começou, no último dia 14 de novembro, policiais cercaram a igreja, bloquearam o acesso ao local, cortaram água e energia elétrica e passaram a ameaçar as mães dos manifestantes detidos. Um grupo de 13 ativistas tentou entregar água para as mulheres pela janela da igreja, mas foi preso pelos policiais.

Entre os detidos está Amaya Coppens, uma líder estudantil belga-nicaraguense, presa pela segunda vez desde que as manifestações contra Ortega começaram. Ela havia sido solta em junho, após passar oito meses detida. Não se tem informações sobre o estado de saúde dos ativistas presos.

Os 13 ativistas foram presos sob a alegação de porte ilegal de armas. A mãe de um dos detidos afirmou que eles não puderam falar com os familiares e nem consultar advogados. Eles tiveram os mandados de prisão preventiva expedidos.

Segundo um comunicado da Arquidiocese de Manágua, a greve de fome foi encerrada no último dia 22 de novembro, com as mulheres retornando às suas casas. Naquele dia, porém, antes do encerramento da greve, dois líderes da oposição de Ortega tentaram, mais uma vez, entregar água para as pessoas que participavam do movimento na igreja. Eles foram detidos temporariamente pelos policiais, levados até Manágua e liberados.

Segundo a HRW, desde que os protestos no país irromperam, em abril de 2018, centenas de pessoas morreram ou foram detidas arbitrariamente, enquanto milhares ficaram feridas em protestos. Não há números exatos – a HRW estima o número de mortos em 328, enquanto a Associação Nicaraguense Pró-Direitos Humanos (ANPDH) diz que são mais de 500 mortos.

Entre outros números, estima-se que 62 mil pessoas já fugiram da Nicarágua. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) estima que mais de 800 pessoas foram detidas desde o início dos protestos. Destes, pelo menos 392 foram soltos entre março e junho deste ano, segundo informou a HRW. Outros 100 foram detidos e soltos em no último mês de março.

A Coordenadoria Universitária – Democracia e Justiça afirmou, no último domingo, 24, que mais de 150 pessoas permanecem como presos políticos na Nicarágua. Os constantes ataques do governo a ativistas e grupos de direitos humanos seguem pelo país.

“O governo deve encerrar a repressão persistente de dissidência e o padrão contínuo de prisões arbitrárias e abster-se de criminalizar e atacar defensores de direitos humanos, opositores políticos e quaisquer outras vozes dissidentes. Reiteramos nossa disposição de apoiar o Estado nicaraguense no cumprimento de suas obrigações internacionais de direitos humanos e voltar ao país se o acesso for concedido”, informou a OHCHR através de uma nota.

Situação na Nicarágua

O atual governo de Daniel Ortega, que foi um dos principais nomes da revolução contra a ditadura de Anastasio Somoza Debayle, que chegou ao fim em 1979, começou a enfrentar uma forte resistência popular em abril de 2018. Na época, o governo tentava implementar uma reforma da Previdência, mas recuou após dias de protestos.

O recuo de Ortega não dissipou as manifestações. O que começou como uma onda de protestos contra a reforma evoluiu para duras críticas ao autoritarismo do presidente nicaraguense. Desde então, milhares de manifestantes, incluindo alguns que eram leais a Ortega, passaram a pedir a renúncia do presidente.

A partir daí, a Nicarágua entrou em ebulição, com confrontos entre manifestantes e forças policiais em diferentes localidades do país. Diante do impasse, a Igreja Católica tentou assumir o papel de mediadora para um diálogo entre ativistas e governo federal, mas não obteve sucesso, até que recuou nas tentativas de conversa com o governo.

Toda a repressão do governo aos protestos colocou a Nicarágua sob o olhar da comunidade internacional, principalmente de grupos de direitos humanos. Isso fez com que, em julho de 2018, 13 países latino-americanos, incluindo o Brasil, divulgassem uma declaração repudiando as constantes violações de direitos humanos na Nicarágua.

No fim de julho do ano passado, uma onda de migração na Nicarágua ganhou as manchetes mundiais. A Costa Rica estava na rota da maioria dos migrantes, inclusive do jornalista Carlos Fernando Chamorro – que voltou à Nicarágua nesta segunda-feira, 25. “Eu tive que ir para o exílio na Costa Rica por causa das ameaças do regime, para continuar fazendo o jornalismo livre”, escreveu o jornalista na época.

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