PREVIDÊNCIA REFORMA

OCDE recomenda previdência flexível, inverso da reforma brasileira

Apenas três dos 35 países da OCDE aprovaram leis visando empurrar para frente, como der e o quanto der, a idade para aposentadoria (Foto: Pixabay)

O último relatório Pensions at Glance (algo como “Aposentadorias em Perspectiva”, em tradução livre) da Organização Para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), foi publicado no último dia 5 de dezembro, e portanto bem no meio da fase mais aguda de discussões sobre a reforma brasileira da previdência social — se é que se pode chamar de “discussões” um cenário em que a mídia mainstream de um país faz aberta campanha pela aprovação da reforma proposta pelo governo da referida pátria amada, restringindo-se, as “discussões”, às tentativas de deixar mais “animados” os deputados apavorados com a curta distância entre um eventual voto “sim” para uma reforma altamente impopular, vista como contrarreforma pela ampla maioria da população, e o dia das eleições 2018.

Seria de se esperar, portanto, que uma perspectiva, uma projeção em especial do relatório da OCDE sobre os sistemas previdenciários de seus países membros, sobre um em particular, chamasse a atenção dessa mídia que se reveza com o ministro da Fazenda do Brasil na tarefa de projetar o fim do mundo como o conhecemos em caso de a reforma da Previdência não ser aprovada. A projeção em questão é essa: em 2050, se nada for feito pelos policy makers cá dos trópicos, o Brasil será o país, entre as maiores economias do mundo, que mais gastará pagando aposentadorias, algo da grandeza de 17% do PIB.

Contribuição ou imposto?

Seria de se esperar também, e porém, caso tivéssemos uma imprensa respeitosa dos postulados básicos do jornalismo e zelosa do seu papel num regime democrático, que a mídia brasileira se interessasse em reportar com igual “escândalo”, por assim dizer, que a reforma da Previdência do governo Michel Temer vai na contramão do que recomenda o mesmo relatório da mesma OCDE, a despeito do mantra repetido ad infinitum de que a reforma visa “eliminar privilégios”, instituindo, isso sim, um dos regimes previdenciários mais inflexíveis do planeta, não obstante em nome do bem da sociedade como um todo. Pois diz a OCDE:

“Definir idades rígidas para a aposentadoria pode não ser algo benéfico para a sociedade como um todo. A aposentadoria flexível é, portanto, um tema importante para quem toma esse tipo de decisão. Formas mais flexíveis de aposentadoria, em que o timing e a velocidade da saída do mercado de trabalho podem ser ajustados, podem beneficiar aqueles que desejam trabalhar em meio período quando estiverem mais velhos, recebendo gradualmente seus direitos previdenciários e melhorando sua renda tanto com o trabalho quanto com a pensão. De maneira mais abrangente, uma maior flexibilidade tem a vantagem de criar diferentes opções para diferentes preferências individuais. Um sistema previdenciário pode ser considerado flexível se houver obstáculos apenas limitados para que uma pessoa possa combinar trabalho com o recebimento de pensão e se as pessoas puderem escolher a idade com que irão se aposentar”.

No dia 20 de fevereiro desse ano a Folha de S.Paulo publicava matéria intitulada: “Com reforma, Previdência do Brasil fica mais rígida que a de países ricos”, mostrando (e assim rompendo ligeiramente com o ronrom), a enorme distância entre o tempo mínimo de contribuição para receber um percentual da aposentadoria no Brasil pós-reforma, 25 anos, e na maioria das maiores economias do mundo, onde chega a ser de cinco anos (na Alemanha). Naquela feita, cerca de dez meses antes da divulgação do relatório da OCDE, o responsável pela área de aposentadorias da organização, Hervé Boulhol, já dizia à Folha, sobre a reforma da previdência do governo Michel Temer: “Exigir um mínimo de 25 anos de contribuição é muito rígido. Se você contribuir por 20 anos e não ganhar nada, isso quer dizer que todas as suas contribuições foram puramente impostos”.

Descompasso de reformas

O relatório Pensions at Glance 2017 informa que, nos últimos dois anos, nada menos que um terço dos 35 países da OCDE mexeram em suas regras previdenciárias, mas apenas três aprovaram leis visando empurrar para frente, como der e o quanto der, a idade para aposentadoria. Essas e outras medidas mais comuns, diz a OCDE, podem ser pouco eficazes contra o que no Brasil convencionou-se chamar de “rombo da previdência”, porque “o aumento esperado da idade para se aposentar será superado pelo avanço da longevidade, o que significa que o tempo que as pessoas passam aposentadas aumentará em relação à duração da sua vida profissional”.

A conclusão é que os sistemas previdenciários dos países, ou melhor, as reformas correntes e vindouras que neles pretende-se fazer, deveriam ter como foco, em vez do aumento arbitrário da idade para se aposentar, em vez da fixação de tempos mínimos de contribuição da escala de um quarto de século, a ampliação das possibilidades e dos atrativos para a combinação entre manter-se ativo no mercado de trabalho, porém com jornada reduzida, e recebimento progressivo da aposentadoria. O adiamento da saída total do mercado de trabalho, diz a OCDE, deve ser suficientemente gratificante para compensar os anos de aposentadoria que uma pessoa teria direito a receber, mas que, mas sob um sistema flexível, pode optar por recebê-la mais tarde.

Segundo a OCDE, pesquisas mostram que um regime previdenciário flexível é um desejo geral das classes trabalhadoras, para que possam diminuir o ritmo de trabalho ao passo que a idade começa a pesar. Mas, “infelizmente”, a palavra de ordem da “flexibilização” parece cuidadosamente reservada para uma outra reforma da mesma família, a trabalhista – a reforma trabalhista que no Brasil “flexibilizou” as regras para o trabalho em meio período, esse tipo de trabalho que a “mãe de todas as reformas” não levará em consideração.Hugo Souza

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