BRASIL DESIGUALDADE

Crianças dizem não ao crime em um dos bairros mais pobres de São Paulo

Crianças caminham para as aulas de balé e de judô. EFE/Fernando Bizerra Jr

De um lado apartamentos de luxo com piscina particular, do outro, o dia a dia da favela de Gustavo, Letícia e Lívia, três crianças que disseram não ao crime e hoje lutam para viver em um dos bairros mais desiguais de São Paulo.

As ruas de Vila Andrade, na região do Morumbi, zona sul da capital paulista, estão separadas por um muro invisível, o da desigualdade.

Neste bairro ninguém sabe explicar com exatidão por que o vizinho vive em um apartamento de luxo e eles em uma situação tão precária, especialmente os menores.

Vila Andrade é o bairro da cidade com menos crianças em creches e com maior tempo de espera para conseguir uma vaga (441 dias), segundo um relatório divulgado neste mês pela organização Rede Nossa São Paulo.

Às carências em educação se somam a criminalidade e o tráfico, segundo explicou à Agência Efe Ester Leão, gerente da Associação Morumbi de Integração Social (AMIS), uma organização sem fins lucrativos que desenvolve 13 projetos na região e atende mais de duas mil pessoas, das quais 647 são crianças às quais é dada a possibilidade de receber aulas de balé, judô e violino.

"O perigo que a criança enfrenta aqui é a exposição à criminalidade. Não tem espaço para lazer, fica pouco tempo na escola ou passa muito tempo sozinha", afirmou Ester.

Gustavo Henrique de Jesus, de 13 anos, vai às aulas de judô há cinco anos e comentou à Efe que já lhe chamaram alguma vez para vender drogas.

"Até assaltaram minha mãe há algumas semanas quando estava voltando de carro da casa da minha avó", detalhou.

O jovem relatou com total precisão que acorda às 6h50 da manhã para ir caminhando ao centro da AMIS, em um espaço cedido por uma igreja batista.

Quando termina, volta, limpa a casa, come com seu irmão de 11 anos e vai para o colégio. Faz tudo isso sozinho porque sua mãe trabalha pelas manhãs.

"Viver na Vila Andrade é bom, mas só um pouco porque tem muita violência", reconheceu Gustavo, que sonha em "ir às Olimpíadas e ter uma bicicleta".

Uma de suas companheiras, Daniele, de 14 anos, já é bicampeã brasileira na sua categoria, embora tenha ressaltado que nem todos optaram pelo mesmo caminho, já que conhece casos de "amigos que hoje estão perdidos".

A AMIS não recebe nenhum tipo de ajuda do poder público e sobrevive pelo empenho de voluntários, professores e apoio de algumas empresas.

"Aqui na Vila Andrade há tráfico e assaltos. Temos pessoas que infelizmente buscam esse caminho na região, entre eles muitos garotos", lamentou Ester.

Segundo dados policiais, na região de Morumbi foram registrados mais de dois mil roubos apenas entre janeiro e julho deste ano.

Duas vezes por semana Letícia, de 12 anos, vai ao centro, onde primeiro aprendeu a tocar violino, depois passou ao violão e agora está motivada com o violoncelo.

"Sempre quis participar aqui até que um dia a minha mãe me matriculou", comentou a pequena, que também falou das aulas de balé.

Para Lívia Vitória, de 13 anos, fazer balé é uma "experiência genial" que também serve como tratamento para a paralisia cerebral.

"Vale a pena o esforço", assegurou à Efe em sua casa, adaptada com o esforço de sua família para poder dar-lhe certo grau de independência.

Lívia Vitória passou por várias cirurgias, a última em 2014, e, após um ano de fisioterapia, os médicos lhe recomendaram realizar alguma atividade física. Foi aí que encontrou o balé, cujos delicados movimentos lhe ajudam a melhorar o controle motor do seu corpo.

A desigualdade na Vila Andrade, como no Brasil, não é fruto da profunda recessão econômica, que claro ajudou a aumentar, mas é uma marca histórica que mostra com estatísticas como em São Paulo 1% dos proprietários possui 25% de todos os imóveis registrados na cidade.

A poucos metros dos edifícios residenciais da área rica, Genusia faz uma reflexão. "Não sei nem explicar... Por que não sou eu que vive aí? Não sei como explicar como uns têm tanto e outros tão pouco".Carlos Meneses Sánchez/EFE

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