A polêmica da dupla-cidadania

Muitas pessoas e governos vem a obtenção de uma nova cidadania como uma espécie de 'traição' à pátria de nascimento

Michele Bachmann renunciou à nacionalidade suíça em apenas 53 dias (Reprodução/Reuters)

Em 1849, o diplomata norte-americano George Bancroft comparou dupla-cidadania à poligamia. Até hoje essa ainda é basicamente a visão de muitos norte-americanos. Em audiência sobre a constitucionalidade da dupla cidadania e do jus soli (direito do solo) em 2006, muitos congressistas a declararam anti-patriótica.

Muitos países já viram e outros ainda veem a dupla-cidadania dessa forma. Na Europa, em 1930, a Liga das Nações defendeu na Convenção de Haia que “é do interesse da comunidade internacional assegurar que todos os membros devem reconhecer que cada pessoa deve ter uma nacionalidade e deve ter apenas uma”. A Holanda tem hoje uma proposta de legislação que vai exigir de todos que se tornem holandeses, o abandono de sua cidadania original e vai forçar holandeses natos que adquirem uma segunda cidadania a perder automaticamente seus passaportes holandeses. Na China, a dupla-cidadania é ilegal.

Cerca da metade dos países do mundo permite a dupla-cidadania de alguma forma e alguns permitem até três. Mas é difícil saber quantas pessoas no mundo tem múltipla cidadania. Governos raramente ficam sabendo quando seus cidadãos se naturalizam em outro país. A regra para a obtenção de nacionalidade também varia. Jus soli (direito do solo) e jus sanguinis (direito do sangue) são os principais, mas em Israel, por exemplo, a Lei do retorno concede nacionalidade israelense a judeus nascidos em qualquer país do mundo. Já a ilha de São Cristóvão e Nevis vende sua cidadania a qualquer estrangeiro disposto a pagar o preço de 250 mil dólares por ela.

Apesar da globalização e da tendência de flexibilização de fronteiras, dependendo de para onde se viaja, determinados passaportes conferem certas facilidades. A questão do vínculo da pessoa com o Estado do qual é cidadã, porém, fica complicada. Em direito, a nacionalidade é um vínculo entre uma pessoa e um Estado. Porém, atualmente, a adoção de uma nova nacionalidade teve seu significado um pouco esvaziado, pela ausência de laços pessoais.

Os Estados Unidos foram criticados após transformarem Anwar al-Awlaki, um membro da Al-Qaeda nascido nos Estados Unidos, em alvo. Ativistas dos Direitos Civis apontaram que ele foi tratado como um criminoso estrangeiro comum ao invés de como cidadão norte-americano. Não se sabe se foi o envolvimento em atividades anti-norte-americanas ou a sua nacionalidade iemenita que “tirou seu direito do solo”.

O coneito de cidadania mudou muito desde seu surgimento. Diferentemente do que acontecia alguns anos atrás, quando as pessoas quase sempre passavam a vida toda no mesmo lugar ou não muito longe de onde tinham nascido, hoje em dia as pessoas se mudam mais, seja por razões econômicas, profissionais ou pessoais. Com isso elas às vezes se identificam mais com um lugar em que viveram ou vivem há muito tempo do que com o lugar onde nasceram, ou se identificam igualmente com ambos. Esse novo contexto, faz a comparação da dupla-cidadania com a infidelidade conjugal parecer um pouco ultrapassada.

Reuters

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