Franceses negam, mas guerra existiu


Argélia: a guerra não declarada da França (Reprodução/Economist)

Em 2006 François Hollande, hoje o candidato do Partido Socialista para a futura eleição presidencial na França declarou “em nome do Partido Socialista” que a Section Française de l’Internationale Ouvrière, o predecessor do seu partido, “perdeu sua alma na guerra da Argélia. Ela tinha suas justificativas, mas nós ainda devemos desculpas ao povo argelino”.
É verdade. Foi um primeiro ministro socialista, Guy Mollet, que, em 1956, ordenou uma campanha de pacificação contra os nacionalistas argelinos. Oposto ao colonialismo, Mollet pode muito bem ter agido com boas intenções, mas a “pacificação” resultou em repressão e incontáveis atos de brutalidade e tortura por parte do Exército francês.
Em retrospecto, é difícil enxergar como a França metropolitana poderia ter imaginado uma posse segura e pacífica da “Argélia francesa”. Uma vez que a guerra eclodiu, nunca houve muita esperança de que os políticos da França, de Mollet a Charles de Gaulle, poderiam ganhar os corações e mentes dos argelinos muçulmanos. Nem poderiam conquistar a confiança e o apoio dos colonos europeus, os pieds noirs (literalmente “pés negros”, ver foto acima), cujo senso de traição os levou a se aliarem com a fútil rebelião contra de Gaulle levada a cabo pelos soldados franceses dissidentes da OAS (Organisation de l’Armée Secrète).
Não foi só a história da Argélia que militou contra ela se tornar uma parte inseparável da nação francesa, mas também o contexto geopolítico do conflito. A onda anticolonialista após a Segunda Guerra Mundial estava forçando as potências imperiais da Europa a reconhecer independência em quase todos os lugares. A França já havia sido derrotada no Vietnã; o primeiro-ministro da Grã-Bretanha Harold Macmillan falou de “ventos de mudança” varrendo a África; e o presidente norte-americano Eisenhower rapidamente obrigou a França, a Grã-Bretanha e Israel a voltar atrás na sua divisão do Canal de Suez, de 1956. As implicações foram reconhecidas por de Gaulle: se a França tinha de ser uma potência a ser considerada em um mundo agora definido pela Guerra Fria, tinha de livrar-se do fardo argelino.
Mas, e hoje? Na França, cidadãos de descendência argelina e outros do norte da África são desproporcionalmente pobres e discriminados; às vezes seus jovens, presos entre duas culturas diferentes, reagem com violência, como nas insurgências urbanas de 2005. Como Evans disse: “Os tumultos de 2005 foram só um exemplo de como o legado da guerra argelina ainda figura por aí”. Enquanto isso, na própria Argélia, o país luta para lidar com o resultado de outra guerra não-declarada: a brutal repressão, pelo Exército, das forças islamitas que, há duas décadas, estavam prestes a tomar o poder pelo voto.

The Economist

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