CRISE HUMANITÁRIA

Argélia abandona milhares de imigrantes no deserto

Desde maio de 2017, mais de 11 mil imigrantes já foram abandonados no deserto pelo governo da Argélia (Foto: OIM)

Janet Kamara ainda se recupera de uma atroz jornada forçada da Argélia até o Níger, através do deserto. De origem liberiana, ela vivia como imigrante na Argélia, onde tirava o sustento por meio da venda de alimentos e bebidas, até ser expulsa do país em maio deste ano.

Grávida, ela entrou em trabalho de parto no meio da travessia, mas o bebê não resistiu. Kamara enterrou o corpo do bebê na areia e continuou a travessia, uma vez que não havia mais o que fazer nem a quem recorrer. Ela andou durante dias com seu grupo, enfrentando temperaturas acima de 48ºC, tendo ainda as manchas de sangue do parto malsucedido nas pernas.

Ela se recorda de ter passado noites ao relento com seu grupo e que nem todos sobreviveram à jornada. Alguns não conseguiam prosseguir, outros simplesmente desapareceram no meio do caminho. “Mulheres e homens caiam mortos. Outros desapareceram no deserto porque não sabiam o caminho. Todos estavam por conta própria”, diz Kamara, que hoje vive abrigada na cidade de Arlit, no Níger.

A história de Kamara não é um caso isolado. Ela é uma entre dezenas de milhares de imigrantes da África Subsaariana que migram para a Argélia para fugir da violência e buscar uma vida melhor. A maioria deles é originária do Mali, Gâmbia, Costa do Marfim e do Níger. Suas histórias foram narradas em uma reportagem especial da Associated Press (confira aqui o texto na íntegra).

Desde que a União Europeia aumentou a pressão sobre os países do norte da África para conter a imigração para a Europa através do Mar Mediterrâneo, o número de imigrantes expulsos pelo governo da Argélia saltou de forma impressionante. Os imigrantes chegam à Argélia em busca de trabalho no país ou na vizinha Líbia. Outros almejam entrar na Europa.

O governo da Argélia adotou um método desumano de expulsão: os imigrantes, incluindo mulheres grávidas e crianças, são levados a um local conhecido como “marco zero”. Lá, são orientados a marchar a pé em direção ao Níger, às vezes sob a mira de armas.

Segundo a Organização Internacional de Migração (OIM), em maio de 2017, 135 imigrantes foram expulsos desta forma. O número saltou para 2.888 registrados em abril deste ano. Segundo a OIM, no total, 11.276 pessoas já foram sujeitas à travessia. Muitas vezes, eles têm os pertences confiscados antes de serem deixados no deserto.

A União Europeia afirma estar ciente das expulsões, mas diz que países soberanos podem recorrer à prática desde que estejam de acordo com as leis internacionais. O governo da Argélia, por sua vez, não dá detalhes sobre as expulsões e recusou tecer comentários à AP sobre a prática, se limitando a dizer que as acusações são parte de uma campanha difamatória que visa inflamar a relação entre países vizinhos da região. Enquanto isso, diariamente, milhares de pessoas seguem sendo deixadas à própria sorte no deserto.OIM

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