CULTURA - Por que os europeus voltaram a ler Stefan Zweig?

'O Grande Hotel Budapeste' que concorreu ao Oscar em 2015, foi inspirado em sua obra (Foto: Wikipedia)

Depois dos últimos anos sombrios na Europa, o discurso volúvel e superficial da década de 1930 voltou à tona. Os laços de confiança entre as nações estão se rompendo e o antigo ditado que a União Europeia (UE) só progride em tempos de crise não passa de um mito. Os populistas estão conquistando cada vez mais espaço na política. O Reino Unido optou por sair da UE. E os países vizinhos da Europa a ameaçam como a Rússia, ou criam uma crise de extrema gravidade com a entrada em massa de refugiados no território europeu. Há pouco tempo, um eurocrata com opiniões mais radicais disse temer uma nova guerra entre a França e a Alemanha.

Não surpreende que os europeus, diante de um futuro tão incerto e sombrio, estejam redescobrindo Stefan Zweig. Um escritor prolífico e autor de romances, biografias e ensaios políticos, Zweig personificou o europeu culto do período entre guerras. Um judeu que viu os nazistas queimarem seus livros, Zweig foi obrigado a partir de seu país natal, a Áustria, em 1934, e, em seguida, da Europa. O sucesso literário de Zweig foi eclipsado por escritores contemporâneos como Thomas Mann e Joseph Roth.

Mas seu testemunho da catástrofe ocorrida na Europa e a dedicação à causa da união europeia ajudaram a retomar o interesse por seus livros. O Grande Hotel Budapeste, um filme inspirado em sua obra e que concorreu ao Oscar em 2015, também despertou o interesse de um público mais jovem.

Em O mundo de ontem, um relato autobiográfico de sua vida na cosmopolita Viena fin-de-siècle, Zweig se despede de seu lar espiritual, a Europa, destruída pela segunda vez por uma guerra mundial. Em 1942, Zweig e sua jovem esposa suicidaram-se em sua casa em Petrópolis.

Na dura avaliação do crítico John Gray, Zweig demonstrou tão pouca coragem durante a vida que sua morte não poderia ser considerada uma tragédia. Mas não esconde a ironia dos acontecimentos futuros. Em 1957, seis países europeus criaram a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (Ceca), que nos anos seguintes deu início ao projeto de união econômica e política dos países da Europa, que Zweig tanto sonhou e defendeu. Uma organização criada em bases tão prosaicas não entusiasmaria a imaginação criativa do escritor e, além disso, com sua mistura pan-europeia Bruxelas jamais se igualaria a Viena de Zweig. Porém a iniciativa teve o objetivo de realizar por meios burocráticos o que Zweig havia esperado alcançar com a educação e a cultura, ou seja, fazer com que a guerra entre a França e a Alemanha, por exemplo, fosse não só impensável, como também impossível.

Em um discurso recente Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, mencionou a observação de Zweig que as pessoas envolvidas em um processo de mudança histórica não percebem seu início. Tusk lamentou o fato de a “armadilha do fatalismo” ter seduzido os políticos moderados atuais que enfrentam a ameaça do populismo. Na época de Zweig, os liberais cediam “quase sem luta, mesmo se tivessem todas as cartas nas mãos”.

As crises dos últimos anos proporcionaram uma resposta. Embora alguns problemas da União Europeia possam ser atribuídos a erros inerentes à sua organização, como a integração furtiva que às vezes tratou os eleitores como pessoas inoportunas, ou as falhas na concepção da moeda única, outros surgiram em decorrência de fatores externos e exigiram uma reação coordenada. Sem a UE, a ameaça da Rússia seria muito maior e os países em conflito teriam tido ainda mais dificuldade para enfrentar a crise migratória. Problemas como mudança climática e terrorismo demandam uma ação coordenada. Apesar de todos os erros e equívocos da UE, as dificuldades da Europa seriam muito mais difíceis de solucionar em sua ausência.The Economist

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A surpreendente cratera de Xico

Por que não enxergamos estrelas verdes ou roxas?

Egípcia posa nua em blog e provoca indignação